A literatura como forma de antecipar o futuro
Em "Previdência privada", Juliana Cunha fala sobre como uma das funções da literatura é adiantar as coisas que ainda não vimos.
Estava lendo um texto de Juliana Cunha sobre como, nesses tempos loucos de covid e ameaças à democracia, ela se apega cada vez mais à literatura para ter vislumbres do que poderemos encarar pela frente.
Porque uma das muitas funções da literatura é adiantar as coisas. O poeta é o único vidente da modernidade, dizia Rimbaud. É o artista que pega as coisas difusas de seu tempo e dá pra elas uma forma — uma primeira forma. É a falta de método da arte que permite que ela aprisione na nascente ideias, fenômenos, sentimentos que só vão ganhar nome e definição bem mais pra frente.
E nossa, não é que é isso mesmo? Imediatamente me lembrei de George Orwell. Muito do que o escritor previu na década de 50, com o livro “1984”, é realidade hoje, como a sensação de estarmos sendo vigiados o tempo todo (e estamos!).
Gosto particularmente de quando Juliana explica que lê como uma detetive, investigando o que a literatura contemporânea já antecipa, mas que ainda não está nítido no nosso dia a dia.
Eu não tenho lidado bem com a ideia de ser surpreendida. A empolgação juvenil de quem acreditava que qualquer coisa podia acontecer há muito foi substituída pelo pavor adulto de que, sim, qualquer - coisa - pode - e - vai - acontecer. Nessa toada crescentemente neurótica, ler literatura contemporânea virou para mim um ato detetivesco. Não é terapia, é previdência privada. Eu encaro livros bons e maus, que serão lembrados e varridos e a pergunta mais importante que tenho para eles é: o que você já diz que eu ainda não sei ler?
Que possamos todos então nos preparar para o futuro com a melhor das previdências privadas, o conhecimento.
E você? Que ficção recente lhe deu uma ótima leitura do que está por vir?